No Princípio, Estava O Talão

Ou recibo. Da candidatura ao mini-concurso. Este é o que guardo do início disto tudo, da minha primeira candidatura. Sou um “guardador de memórias”, cada vez menos de sonhos e muito raramente de vacas (não me façam perguntas a esse respeito 😀 ). Há gente bem mais antiga do que eu, mas o contingente estica-se mais para o lado dos que entraram mais tarde e desconheceram, como alunos ou professores, muita coisa, pois só assim se entende tanto disparate. Sou dos que quer acreditar que o progresso ainda é possível e que a Humanidade não ficou encravada com esta malta da terceira e quarta via, no meio da auto-estrada, na lógica do “antes pobrezinhos e caladinhos, que outra coisa que não sabemos”. Mas isto já foi mau, quiçá pior, sem subsídio de desemprego, na altura a contagem ao dia do serviço (o meu registo biográfico é uma recordação deprimente de alguns anos, em especial daquele em que tive 21 horas desde a segunda semana de Outubro).

Mas não é por isso que desejo que quem agora anda por aí passe pelo mesmo e farei tudo para que isso não lhes aconteça. Nem invejo quem conseguiu ter uma carreira inteira, sorte deles, que se conseguiram aposentar quase inteiros. Temos o nosso tempo e a nossa circunstância e temos de lidar com isso, racionando as invejas e os remoques de desforço contra os outros que não têm culpa de vivermos tempos medíocres. Isso não é razão para querer arrastar todos para a mediocridade. Já sei que perdi anos de serviço, que tive de andar a saltar barreiras, como numa corrida de obstáculos e isso apenas me faz querer que isso não se repita e… esperança “micronésima”… que restasse um pingo de decoro e não andassem a mingar as aposentações antecipadas a quem delas precisa mesmo, a bem de todos, a começar pelos alunos.

Tudo começou a 20 de Setembro de 1986, ao que parece um sábado, porque então se tinham e davam aulas ao sábado, bem como se faziam outras coisas como rumar a Setúbal para meter a papelada, com duas cópias em branco para ter a certeza que se houvesse algum erro, se poderia substituir a inicial. Também estranhei, mas aquilo não é um 26, acho eu que tenho duas paleografias feitas, mais uma epigrafia. Ou talvez seja. Com os seus interregnos, já lá vão muitos anos. Que me tiraram a paciência para muita parvoíce (ia escrever “porfirice”, mas o tipo anda agora a fazer de porta-voz parlamentar e deixou a Educação para outr@s, pelo que poderia apenas escrever “sonsice”), mas me deram a capacidade de ver em perspectiva histórica o trajecto de certas figuras deprimentes que por aí andam, cacarejando a cada vez que há milho na capoeira, como se não nos lembrássemos que sempre quiseram estar do lado de quem distribui as rações.

São muitos anos, pronto.

Adenda: ler em complemento este texto do Carlos Santos.

2 opiniões sobre “No Princípio, Estava O Talão

  1. O denominado miniconcurso. As filas. As filas para comprar os impressos; listas. listas mais depuradas para ter a certeza de que se seguia uma determinada ordem. Pior, eram os concursos nacionais, com o mapa a ver estradas e distâncias. Gente sentada no chão preencher os impressos e a perguntar onde era “Campo” ao colega do lado, lá se descobria que era Valongo e assim por diante. A ansiedade era sempre a mesma. Mas não havia esta raiva, este ódio aos que metem atestado, aos que vão reformar-se, é a demência completa. Times are not changing at all.

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  2. Também já houve aulas ao sábado de tarde, quando o Sócrates ouviu o relato de Portugal em 1966. Até ao domingo, quando o Sócrates acabou a licenciatura na universidade privada.

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