Uma Espécie de Antigo Regime Em Matéria de Educação

Há uns anos escrevi vários posts sob o lema do “feudalismo” na Educação, fosse por causa da forma como em cada zona se tomavam decisões sobre matérias que deveriam ser de regulação central clara – em especial por alturas da “implosão” cratiana do ME, fosse pelo que se anunciava em termos de municipalização. Em qualquer dos casos a ideia de uma estrutura “feudal” em que cada “senhor” decidi(ri)a no seu “território” relacionava-se com a desarticulação de uma coerência nacional no exercício do poder na área da Educação.

Actualmente, parece que evoluímos para uma situação de “Antigo Regime” em algumas áreas da governação educativa, pois há matérias que parecem ser objecto de notável privilégio de alguns sobre o resto da “populaça”. Como os reis de outrora que outorgavam direitos, tenças e privilégios particulares sem qualquer obediência ao princípio (liberal) da igualdade e equidade de tratamento dos súbditos (não encarados como cidadãos), o actual poder na Educação optou claramente por se apoiar em alguns grupos específicos de interesses para fazer avançar algumas “reformas”, “recompensando-os” com o acesso em primeira mão às decisões e à possibilidade de fornecer “formação”. Os “planos de sucesso”, o “perfil para o século XXI” e a “flexibilidade e autonomia” foram as mais visíveis dessas áreas (há nomes que se repetem na consultoria ou apoio ao ME na definição das políticas, nas iniciativas de “formação” de editoras e instituições e ainda em júris de prémios sobre “boas práticas), mas estão longe de ser as únicas.

A mais recente parece-me ser a do Ensino Especial, em que se anunciou uma nova legislação que ainda não apareceu, mas para a qual já existe “formação”. Dada por quem e com base em que conhecimento privilegiado do que aí vem?

Não é de agora que esta espécie de opacidade existe, eu sei. Lembro-me dela em outros períodos, com casos muito específicos, tendo mesmo escrito sobre alguns nos tempos do Umbigo. Mas há períodos em que parece que qualquer preocupação deontológica ou ética é considerada bizantinice ou escrúpulo perfeitamente desajustado em relação à “urgência” de fazer coisas. E o poder “concede” um acesso desigual à informação, de modo a permitir uma vantagem comparativa aos “seus”, por oposição aos “outros”. Que agradecem o favor com a sua fidelidade.

Porque o absolutismo do Antigo Regime não era contraditório com a existência de numa miríade de nichos de privilégio. Aliás, fazia parte da sua matriz da sua forma de exibir o Poder. Mesmo com História aos semestres é possível ensinar/aprender coisas destas.

feudalismo22

38 opiniões sobre “Uma Espécie de Antigo Regime Em Matéria de Educação

  1. A matriz anti-democrática, persecutória e discricionária, do Antigo Regime, está implementada em toda a sua extensão na Escola em Portugal. Tudo começou no tempo da famigerada mlr e faz parte de uma estratégia de amesquinhar, amordaçar e amedrontar os professores. Os seus comissários no terreno são os, privilegiados, diretores, a quem garantiram suplementos chorudos, poder absoluto, sem controlo e “eterno” (disfarçado numas salazarentas e esotéricas assembleias de uma dúzia de correligionários a que chamam eleições!) tudo em troca de fidelidade canina à tutela.
    Tudo isto com a bênção, pasme-se, do BE e PCP!!!!!

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    1. Exactamente! A Democracia nas escolas está morta há muito tempo.

      O Conselho Geral é uma aberração anti-democrática.

      Um Professor que seja um verdadeiro democrata nem aceita participar num órgão tão elitista como o Conselho Geral nem se pode candidatar a Director, uma vez que isso implica ser eleito por um órgão onde estão apenas 7 professores, existindo duas ou três centenas no agrupamento.

      Mas em que raio de “democracia” vivemos nós? E há Professores que pactuam com isto? Que branqueiam esta palhaçada votando e fazendo parte destes órgãos? Comigo não contam!

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      1. Sou contra a constituição do CG, pela forma como se aproxima de uma espécie de Câmara Corporativa mais do que de um Parlamento. mas olha que é o único órgão onde ainda tens professores eleitos de forma directa a partir de todo o corpo docente.

        (declaração de interesses… estou num)

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  2. Numa escola livre e democrática, têm de ser os professores a decidir UNIVERSALMENTE sobre os diversos cargos e decisões importantes.

    O CG tem 7 professores em 21 membros; isto é ridículo e só se explica pela intenção clara de humilhar os professores. E alguns alinham nisto? Um órgão decisivo em que há quase tantos pais como professores? 7 professores (num universo de 250 ou mais) vão eleger a Direcção?

    Os coordenadores de Departamento não são escolhidos livremente mas apenas entre os 2 ou 3 nomes em que a Direcção permite que se vote após escolha prévia (deles).

    Mas que raio de Democracia é esta?

    O que mais me revolta é que haja Professores que votam para estes cargos, que fazem parte deles e assim branqueiam a sua existência e a legitimam.

    Não pode ser! Se somos democratas temos de nos recusar a participar nesta palhaçada. Se nenhum Professor se candidatar a estes lugares (CG, Coordenadores) o Ministério é obrigado a mudar tudo isto. Enquanto houver os que alinham (Por vaidade? Por graxismo? Por “deixa andar”? Todas as anteriores?) isto vai continuar como está.

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    1. Só um detalhe… no meu cg, os professores são 7 e os ee são 6.
      Discordo, desde o início, deste modelo de gestão e por isso mesmo fui dos que promoveram a apresentação de uma parecer jurídico do GPereira a demonstrar como ele contraria a letra da LBSE.

      Não vou dizer, como outros, que estou lá, porque antes eu do que outros.
      Apenas que, como escrevi, é o único órgão que tem professores eleitos por todo o corpo docente do agrupamento.
      Não me candidataria a outro.

      Quanto ao que aconteceria se todos recusassem candidatar-se?
      Infelizmente, teríamos os “estabilizadores de serviço” a tomar conta da coisa, alegando esses sim, que antes eles do que outros. Muitos deles com cartão da organização que se diz contrária ao modelo. afinal, não há tantos directores desse tipo? 😦

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      1. Mais um detalhe… os cargos de chefia intermédia continuam a ser escolhidos, na prática, pelas Direcções. Quando há “eleições”, as mesmas são restritas. Até que ponto estamos dispostos a ir na recusa do modelo? Devemos recusar estar presentes em reuniões de departamento? É uma outra possibilidade.

        Sim, em tempos achei que essa seria a estratégia certa. Bloquear todo o sistema com a nossa recuasa.
        Mas, logo com a add, vi que muitos que marcharam contra a coisa e se declaravam totalmente contrários ao modelo, foram dos mais fáceis a convencer a ser avaliadores. E até, a partir de dado ponto, orgulhando-se da formação feita. Olha… aí é que não me apanharam, mesmo tendo de ser avaliado por colegas que nem adiante de mim estavam na carreira.

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    1. É assustador ver que 10 anos depois tudo continua na mesma!
      Ah! Com o BE e o PCP, que sustentam este governo, a dizerem “ainda não é o tempo, não podemos queimar etapas”, dez anos depois????!!!!!
      É tempo quando? Na próxima vida da Catarina (..:é filha de um galardoado da mlr… que se CANDIDATOU ao prémio, foi à festa e recebeu o dinheiro, alinhando na política da dita…!) ou do Jerónimo?

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    2. Eu acho que o problema da nossa classe sempre foi o carneirismo.

      Refilam, refilam, mas acabam por amochar e alinhar em tudo. Dão-lhes migalhas (em forma de cargos, elogios, promessas de subir na carreira) e muitos Professores só não dão o traseiro porque ninguém lho quer.
      É triste ver certo tipo de cenas e de gente que diz uma coisa e faz o oposto, muito triste.
      Por mim, que conto todos os dias o tempo que me falta para sair desta palhaçada que escolhi como profissão, recuso e SEMPRE RECUSAREI alinhar em órgãos que não são democráticos. É esta a minha posição, aceito que haja outras mas tenho dificuldade em compreendê-las.Alguém tem de lá estar? Não concordo. Ninguém devia lá estar, se fossemos uma classe unida e consciente.

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      1. Aurora,
        eu sou Chorão só de nome (azares da vida…) mas NUNCA ninguém me viu a chorar por cargos, favores, benesses seja de que tipo for. Isso posso garantir.

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      2. Não é porque “alguém tem de lá estar” que lá estou.
        Há razões particulares que desinteressam aqui.
        O mais importante continua a ser: onde podemos definir a fronteira do carneirismo?
        Agrupamento, escola, departamento, grupo?
        Também eu conto os dias, mas são muitos, que me faltam para sair disto.
        A menos que saia antes, quando me cansar de contar os dias. 🙂

        Não é como desculpa que afirmo, mas, neste momento, o CG é o único órgão onde no sistema educativo há professores eleitos de forma democrática.

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  3. Já agora, quantos clientes, por o serem, têm lugar na administração da sonae, e da JM…e quantos doentes estão na administração dos hospitais?
    Risível, se não fosse dramático.

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  4. Ainda:
    Se todos reconhecem ser este um modelo de gestão profundamente anti-democrático;
    Se é mais caro, aos cofres do Estado,
    que o anterior, os diretores tiveram 100% de aumento no suplemento(!!!!!);
    Se, já foi referendado, desagrada à esmagadora maioria;
    Se não trouxe qualquer melhoria às escolas, pelo contrário tem conduzido a uma degradação brutal do ambiente de trabalho;
    Se tudo o descrito não pode beneficiar, pelo contrário, a qualidade do serviço prestado, por que mantém, o atual governo, este modelo?….
    Não sei se quero ouvir a resposta….

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  5. Paulo: eu sei que o CG tem professores democraticamente eleitos; o problema é que são apenas 7 em 21 membros, o que é ofensivo da nossa dignidade.

    Em nossa casa (escola) mandamos nós. Ponto. E não os papás, os políticos ou os cooptados da “sociedade” (que raio de treta é essa?). É um órgão que nos ridiculariza. Esta é a minha opinião, mas eu não sou dono da Verdade, apenas das minhas opiniões.
    _______________

    Nota pessoal: nós 2 somos da mesma geração (2 anos de diferença), a minha mulher também é de História (da Clássica). Somos de uma geração que ia para Filosofia (eu) ou História, esperando assim compreender melhor a realidade e poder contribuir para a mudança do mundo.
    Sonhávamos ajudar a construir uma melhor consciência dos jovens, ajudar a formar adultos críticos e participativos, enfim, ajudar a melhorar as coisas…
    Agora contamos os dias para a reforma. Onde raio deixámos os sonhos? Quando nos esquecemos de nós próprios? Com que merda nos conformámos?

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    1. Caro JC… há sempre a hipótese do ´”mau feitio” dar luta ao sistema e a questão do “mandar” não ser retirada aos professores, tudo dependendo de alguns factores “específicos”.

      Os “sonhos”, confesso que nunca os tive muito em matéria de docência, para além da influência directa que possa ter nos alunos, pelo menos em alguns que umas décadas depois se lembrem e compreendam as minhas “fúrias”.

      Quanto ao resto, limito estragos.

      Os “sonhos” reservo-os para o que possa ser uma vida pessoal não intoxicada pelos idiotas de brilhantina e gravata mal escolhida que passam por ser entendidos nisto. A História e a Filosofia são inimigas destes salta-pocinhas que fazem gala da ignorância e que, sem vergonha nenhuma na cara, fingem que não ouvem ou sabem a merda que andam a fazer em troca dos dinheiros de Bruxelas.

      Acredita… haverá o dia em que, cansado de contar os dias, também me cansarei de auto.censura em relação a gente que, mesmo que estimável, anda nisto de olho em tudo menos no “superior interesse dos alunos”.
      😉

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      1. Aguardo por esse dia. A sério.
        E aproveito para agradecer este Farol, em forma de quintal, que sempre nos vai permitindo saber uns dos outros e, mais que não seja, desabafar e sentirmo-nos menos isolados. Obrigado por todo este trabalho, Paulo.
        um abraço aqui de Évora.

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    2. O C.Geral funciona de forma democrática ???
      Eu tb pertenci a um. Estava tudo bem cozinhado previamente … até as listas com os diferentes candidatos /assinaturas apoiantes era feito às escondidas.
      Há alturas em que acabamos por alhinhar … há algo em troca … essa é que é a grande verdade.
      Tipo toma lá, dá cá !

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      1. Magalhães, nem sempre, nem sempre… O funcionamento do CG é democrático qb, desde que o encaremos como uma câmara corporativa. Como disse, a parte mesmo democrática é a da eleição do pessoal docente. Que há cozinhados por aí, eu sei… mas como eu gosto mais de alimentar-me do que de ser alimento…

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      2. Uma vez ( tudo às escondidas uns dos outros) eu já tinha sido convidado e aceite pertencer a uma lista. Pediam-me para nada divulgar.
        Posteriormente vieram pedir-me ( tudo às escondidas tb ) para eu integrar uma segunda. Eu fui sincero. Disse-lhes q já pertencia a outra , mas q não comentaria nada.
        Acho q ficaram furiosos e nunca mais foi a mesma coisa …
        E colocar a chefe do pessoal menor a recolher assinaturas de profs. apoiantes às escondidas ? ( profs em aula ) .
        E ser logo( às 8:30 h ) afixada a lista e apoiantes…
        Depois eleição do director … subserviência perante os presidentes da junta… fiquei saturado mesmo.Aliás, sempre achei que todo o processo era falseado . As pessoas são … !
        É que não há meio termo. Ou alhinhas , ou és contra. E eu queria era ser professor !

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      1. Caro PG,
        CONVÉM, significado: amesquinha, amordaça, persegue, humilha,…
        Nota: se os professores fossem artistas tinham este problema resolvido em 2 dias….e até nem custava milhões!!!!

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  6. Variava consoante a escola. Tal como este. Até no tempo do Caetano havia de tudo. Os modelos são como os fatos: o melhor é talhar à medida.

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    1. Mais do que os modelos de gestão, o que importa são as pessoas que lá estão. Prefiro um mau modelo com boas pessoas (competentes e verdadeiramente interessadas) que o oposto. O ideal era outra coisa, mas os ideais andam caros…

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    1. Pois… então deve ser por isso que os bondosos partidos de esquerda não forçam a mudança de modelo de gestão nas escolas. Devem ter a tua fé.

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  7. Eu prefiro um modelo com regulação (auto e/ou hetero) do disparate e do abuso, que não tenha na sua matriz a recompensa da obediência acrítica à hierarquia.

    Mesmo com “boas pessoas” um modelo sem esse tipo de regulação ou limitação dos poderes individuais tende a ser disfuncional.

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    1. Paulo, deixe l@dr@r o habano. É um daqueles rapazes que o quase eng. usava para desestabilizar nas redes sociais. Ou estamos esquecidos que o Costa era o n°2 do dito. A m***@ é a mesma, as táticas também.

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  8. Então o que prefere é que haja regulação, o que não depende do modelo mas sim da existência de estruturas hierárquicas locais, centrais e transnacionais. No entanto voltamos ao mesmo, porque seja qual for o modelo de regulação a sua eficácia também depende das pessoas que o protagonizam. Em suma, sem um bocadinho mais de juízo, de honestidade e de competência não haverá modelos salvíficos. Sendo assim talvez seja melhor gastar o dinheiro na melhoria das aulas de ginástica. O que não quer dizer que seja de desprezar o voluntariado de pessoas de bem que queiram candidatar-se aos órgãos.

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